Wladimir Saldanha: Cacau Inventado. |
Não
se pode negar que o volume Cacau
Inventado é um dos sustentáculos primordiais da Série Horizontes, coleção esta que, embora possa mostrar um ou
outro ponto de questionamento, é hoje a principal expressão literária em
conjunto da Bahia.
Se
era difícil fazer pouco caso com a obra do poeta publicada até então, com o
aparecimento de Cacau Inventado, fica
ainda mais difícil ignorar a presença de Wladimir Saldanha. Fazer isso, através
do silêncio e da orquestração suja, é sonegar uma trajetória honesta, pautada
na absoluta qualidade literária e no juízo de quem preza e leva a sério o
estudo da poesia. Resumindo: uma burrice. E o pior: é sustentar uma mentira,
que fatalmente irá se desmanchar no futuro, porque esse livro permanecerá e
prevalecerá com Opus Magnum. Ou seja, perde-se a oportunidade de apreciar
um dos nossos melhores poetas da atualidade.
SONETO DO CACAU SEM
LÁGRIMA
No ar ressecado do que sou de morto.
Cyro de Mattos. Sonetos da vassoura-de-bruxa.
Não te aconselho chorar, quando passes
e mires o deserto de nutridas safras (...)
Florisvado Mattos. Canto clamor cacau.
Essa dor é sem
lágrima, sem mar,
embora o mar bordeje
aquelas beiras.
É uma dor sem chuva,
nem molhar
o imaginário estio:
pedra e poeira.
Ilhas do étimo, ilhéus
de dicionários,
é tudo inverossímil:
corredeiras
não mais prosperam, e
dos Milionários
já nem é bem a Praia, mas a areia.
Há todo um mar ocluso
na paisagem
do cacau, amêndoa que
se purga
sem maresia,
acidulando a aragem.
Há grossos rios que
vão morrer na curva.
Se um porto seca, sem
matalotagem,
não chore a safra: não
invente chuva.
(SALDANHA, 2015,
p.27).
SALDANHA, Wladimir. Cacau
Inventado. Ilhéus: Mondrongo, p.34.